Opinião

Palácio Imperial, Independência ou Morte

Em 2 de setembro de 2018, um domingo, um curto-circuito num aparelho de ar-condicionado deflagrou um incêndio que consumiu durante seis horas 80% do acervo do hoje chamado Museu Nacional. Entretanto, o que ardeu foi  o Palácio Imperial de São Cristóvão da Quinta da Boa Vista, construído por d. João VI, quando de sua permanência no Brasil, em junho de 1818. Tinha acabado de completar 200 anos.

Coincidência? Também foi em 2 de Setembro de 1822 que a Imperatriz D. Leopoldina assinou o decreto de independência do Brasil. 196 anos separam os dois eventos. O Palácio de São Cristóvão foi residência da Família Imperial, onde viveram D. Pedro I e D. Leopoldina, onde nasceram a futura Rainha de Portugal, D. Maria I e o futuro imperador do Brasil, D. Pedro II, que ali foi educado e viveu; onde nasceu também a Princesa Isabel.

Sobre o que foi perdido: (dentre outros itens)

• Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado no Brasil;
• Dinossauro proveniente de Minas Gerais, o primeiro de grande porte montado para exposição no Brasil;
• Cabeça mumificada produzida pelos Shuar (Jivaro): raro exemplar de cabeça encolhida
• Acervo de mais de cinco milhões de exemplares de insetos: O Museu Nacional era considerado um dos maiores centros de diversidade entomológica de toda a América do Sul;
• Coleção de arte e artefatos greco-romanos da Imperatriz Teresa Cristina (Imperatriz Consorte do Império do Brasil de 1843-1889), esposa de d. Pedro II;
• Coleção do Egito Antigo: múmias, sarcófagos, urnas funerárias, estatuetas e outros artefatos, totalizando quase 700 objetos conseguidos graças a doações e compras;
• Meteorito Bendegó: coletado na Bahia, era o maior meteorito brasileiro e estava entre os maiores de todo o mundo;
• Objetos da cultura indígena, afro-brasileira e do Pacífico, itens únicos e não restituíveis;
• O icônico trono do rei africano de Daomé, um presente recebido por D. João VI em 1811, também não sobreviveu.

A tragédia começou antes do incêndio: o pior destino para o Museu foi sua subordinação à UFRJ:

• Só no ano de 2018, a UFRJ foi palco de três incêndios, e o do Museu nacional, sob sua responsabilidade foi o último. Em agosto, uma explosão de menor proporção no laboratório de metalurgia do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe) deixou três feridos. Em junho, o nono andar do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, conhecido como Hospital do Fundão, também pegou fogo. Ninguém se feriu. Entre 2011 e 2017, foram mais cinco incêndios em diversos departamentos e instituições ligadas à UFRJ.
• A UFRJ, gestora do museu, recebeu do governo federal R$ 2,6 bilhões em 2014 e teve aumento para R$ 3,1 bilhões em 2017. Nesse período, a instituição diminuiu os repasses para o Museu, que já se encontrava em situação de penúria, com recursos da Rei Rouanet represados e ainda não liberados à época da tragédia.
• Vinte anos antes, para gerir pessoalmente as verbas totais e concentrar poder administrativo, a UFRJ se recusou a fazer do museu uma fundação, o que resultaria num aporte de R$ 80 milhões do Banco Mundial para o prédio histórico.
• Em 2015, a esquerda de plantão comemorou a nomeação do reitor fundador do PSOL, Roberto Leher, porque sabia não apenas da representatividade de ter um de seus membros como reitor da maior universidade federal do país, em função da força midiática e doutrinária da instituição, mas das verbas que poderiam concorrer para fomentar movimentos, pesquisas e departamentos de interesses ideológicos.
• Dois anos depois, em 2017, a procuradoria da república entrou com uma representação contra Leher por improbidade administrativa, por usar a estrutura da Universidade para promover atos político-partidários.
• O incêndio no Museu da Quinta da Boa Vista queimou também a direção da Universidade Federal do Rio de Janeiro, com a exoneração do reitor Roberto Leher – pedagogo fundador do PSOL – e a nomeação de Denise Pires de Carvalho, em junho de 2019, a opção menos pior de uma lista tríplice.
• Apenas 10% do acervo poderão ser aproveitados, mesmo assim graças aos esforços dos funcionários que se atiraram às chamas, junto com os bombeiros, para salvar uma parte da nossa História, enquanto a reitoria se preocupava em fugir às responsabilidades, chorando pitangas na imprensa e nas redes sociais
• Igualmente dramática é a situação do Museu do Ipiranga, ou Museu Paulista, em São Paulo, pois seu fechamento desde 2013 impediu que uma geração inteira tivesse acesso ao acervo, que está distribuído em três imóveis alugados com dinheiro público, sem fiscalização, enquanto uma reforma prometida para 2022, bicentenário da Independência do Brasil, está oculta dos olhos da população.
Situação do Museu hoje:
• Museu Nacional passa por um processo de restauração e deve ter algumas salas reabertas ao público em 2022 – e deve estar completamente pronto em 2025. A previsão é do diretor da instituição, Alexander Kellner.
• Ainda este ano, deve começar a restauração da fachada e do telhado. Em setembro do ano que vem, a expectativa é que comece a recuperação do interior do palácio.
• Dos R$ 85,4 milhões destinados ao Museu Nacional, R$ 55 milhões virão do Orçamento da União para 2019, aprovado pelo Congresso Nacional em 19 de dezembro. A verba foi indicada por deputados da bancada do Rio de Janeiro e apresentada como emenda impositiva, aprovada pela Comissão Mista de Orçamento.
• Outros 15 milhões, já em caixa, vieram do Ministério da Educação para obras como a contenção de paredes que ficaram em pé após o incêndio e a criação de estrutura para proteger os destroços, além da elaboração de um novo projeto museológico.
• O Ministério da Ciência e Tecnologia destinou R$ 10 milhões que também serão aplicados na reconstrução do prédio e na compra de equipamentos dos laboratórios de pesquisa da instituição. A retomada de pesquisas interrompidas com o incêndio receberá mais R$ 2,5 milhões da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão vinculado ao MEC para expansão de programas de pós-graduação no país.
• Já está sob os cuidados da UFRJ o montante de 180,8 mil euros doados pelo governo da Alemanha – a verba é parte do montante de até um milhão de euros que o governo alemão vai destinar ao Museu. Além disso, foi negociada com a empresa Vale a doação de mais R$ 2 milhões para recomposição do acervo de mineralogia e etnografia. Outros R$ 100 mil foram arrecadados desde o incêndio pela campanha SOS Museu Nacional.

Uma visão mais estratégica poderia ligar facilmente a verve incendiária da esquerda a outras circunstâncias semelhantes que deixaram o Brasil e o mundo intranquilos e mancharam nossa reputação de bons cidadãos, ordeiros, pacíficos e honestos. O plano macabro que passa por colocar fogo na nação tem como fim reduzir a cinzas nossa História, nossa memória, nosso território, desacreditando o próprio povo que rejeitou e rechaçou a ditadura comunista que queria se estabelecer no Brasil. Precisamos também varrer essa sujeira para fora do campo cultural e ambiental.

Fontes: Brasil Escola, R7 Rio de Janeiro, IPCO, Duna Press Periódico, Agência Brasil

Créditos de imagem: O Museu Nacional do Rio de Janeiro, um dos mais antigos do Brasil, enquanto é consumido pelas chamas. Reuters. Fotografia de Ricardo Moraes.

Revisão e edição de Luiz Gustavo Chrispino.

Vera Amatti

Colunista associado para o Brasil em Duna Press Jornal e Magazine, reportando os assuntos e informações sobre atualidades sócio-políticas e econômicas da região.

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