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O Paradoxo da Moralidade Corporativa: A Alemanha entre Crises e Contradições

A Alemanha, outrora modelo de prosperidade e estabilidade, enfrenta uma longa lista de problemas que vão desde a queda da natalidade e o aumento da criminalidade até o envelhecimento da população e o colapso do Estado Social. Além disso, a chegada de centenas de milhares de imigrantes disfarçados de refugiados, o empobrecimento social, a luta contra as mudanças climáticas, as cotas de gênero nos conselhos de administração, o aumento dos impostos e a saída de empresas para os Estados Unidos devido ao preço da energia agravam ainda mais o cenário. O fracasso no recrutamento militar para as Forças Armadas é outro exemplo das dificuldades enfrentadas pelo país.

Essas questões têm sido exacerbadas pela guerra na Ucrânia e pelos objetivos do globalismo, revelando e intensificando as fragilidades da Alemanha. No entanto, a reação das grandes empresas não tem sido exigir que os políticos resolvam esses problemas, mas sim tentar influenciar os votos dos seus funcionários contra a Alternativa para a Alemanha (AfD), o único partido que, segundo eles, não tem responsabilidade pelo desastre social e econômico em que a maior nação da União Europeia está se transformando.

Há meses, executivos de multinacionais alemãs têm atacado a AfD, argumentando que o programa do partido, que se opõe à imigração descontrolada, prejudica seus negócios. Roland Busch, CEO da Siemens desde 2021, é uma figura de destaque nesse movimento. Em fevereiro, ele defendeu a imigração em uma publicação no LinkedIn e criticou os planos da AfD de expulsar residentes ilegais, classificando-os como cínicos e desumanos. Busch afirmou que a extrema direita prejudica a Alemanha e põe em risco sua prosperidade, que se baseia em “pessoas que nos procuram e querem contribuir com suas capacidades”.

Pouco depois da crise migratória incentivada pela então chanceler Angela Merkel em 2015, tornou-se público que alguns refugiados estavam trabalhando por apenas um euro por hora, uma situação que não contribui para o pagamento das pensões.

Recentemente, gestores de trinta multinacionais alemãs, incluindo Bayer, BMW, Allianz, Volkswagen, Deutsche Bank, Ford, RWE, Thyssen e 02 Telefónica, que empregam 1,7 milhão de pessoas, apresentaram um manifesto intitulado “Defendemos Valores”, em oposição à AfD. Durante a apresentação, Busch afirmou que a aliança defende respeito, tolerância, abertura e diversidade, valores que, segundo ele, são questionados por extremistas e racistas que oferecem soluções aparentemente simples para problemas complexos.

Entretanto, várias dessas empresas têm históricos de envolvimento em escândalos graves. A Volkswagen, por exemplo, manipulou medidores de partículas poluentes em milhões de veículos movidos a diesel entre 2009 e 2015, resultando em multas e acordos extrajudiciais. A RWE, por sua vez, despejou residentes de Lützerath para explorar uma mina de carvão, e o Deutsche Bank foi multado por se beneficiar da rede de negócios e chantagem de Jeffrey Epstein.

O caso mais notório é o da Siemens, cujo CEO, Roland Busch, continua a dar lições de moralidade enquanto a empresa ainda carrega o fardo de um passado de corrupção. Em 2006, uma investigação interna revelou que altos funcionários pagaram subornos de bilhões de euros para garantir contratos em diversos países. A Siemens teve que pagar cerca de 1,5 bilhões de euros em multas nos Estados Unidos e na Alemanha, e em 2019, tribunais gregos condenaram 22 arguidos por lavagem de dinheiro e suborno.

Embora Busch não seja responsável por essa corrupção passada, seu salário e bônus vêm de uma empresa enriquecida por tais práticas. Esse paradoxo de moralidade corporativa levanta questões sobre a legitimidade dessas empresas em se posicionarem como guardiãs dos valores sociais.

O exemplo alemão ecoou na Espanha, onde o presidente Pedro Sánchez pediu às empresas espanholas que fizessem o mesmo em relação ao partido VOX. No entanto, resta saber se executivos e famílias numerosas ousarão seguir essa orientação e influenciar o voto de seus funcionários.

Essa situação complexa e contraditória expõe as tensões entre interesses corporativos, valores sociais e a realidade dos problemas enfrentados pela Alemanha contemporânea.

Wesley Lima

Colunista associado para o Brasil em Duna Press Jornal e Magazine, reportando os assuntos e informações sobre atualidades culturais, sócio-políticas e econômicas da região.

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