Cada vez que falo de educação lembro das mudanças que observei nesses quase 55 anos de vida ligada a educação como aluno e professor. Essa série de artigos semanais que vou produzir conta um pouco da minha experiência de vida dentro da educação brasileira.
Como discente, além de aluno fui diretor de Grêmio Estudantil e dirigente de Diretório Acadêmico, como docente, durante quase 20 anos participei da vida como professor de escolas particulares, cursos de formação, ensino superior e até professor de Pós-Graduação e nos últimos 16 anos, participo da educação como professor de educação pública municipal.
Nesse primeiro momento vamos conversar sobre a educação na década de 60.
Vamos então para os anos 60 e como estudante de escola pública cursei todo o antigo primário em escola pública, colecionando menções honrosas nos seis anos do antigo primário como um dos três melhores alunos da turma, e essa valorização era importante, pois, mostrava como o aluno era valorizado. Claro que a educação era de outra forma. Dentro do que se conhece como Decoreba, ou seja, matérias de Ensino Social eram muito mais voltadas para o decorar datas e fatos. Português e Matemática eram matérias com alta carga de ensino. O Rigor de comportamento era presente, estávamos em pleno período de Governo Militar, onde o rigor era muito imposto, mas, nunca ninguém morreu por cantar Hino e formar para entrar.
O comportamento era fundamental: Formávamos para entrar nas salas, onde, após cantar o Hino Nacional, éramos conduzidos pelos Inspetores a nossa sala, onde aguardávamos nossos professores. Ao chegarem, nos levantávamos e aguardávamos sermos liberados para nos sentar, isso era em todas as escolas, fossem públicas ou particulares.
Nossos pais tinham a obrigação de pagar o Caixa Escolar, uma pequena taxa mensal para custear as folhas de almaço que recebíamos para fazer nossos testes e provas… Lanche? Levávamos, me recordo do sanduíche feito pela minha mãe e do Guaraná Caçulinha da Antártica que ela comprava diariamente. Dentre este valor recebíamos também o Bolso, com o emblema da escola, para costurar no bolso da camisa branca, que junto com a calça azul marinho de Tergal e sapato preto, lembro do Passo Doble, Vulcabrás 752, íamos todos com o mesmo padrão, visto que era UNIFORME.
Material? Livros, cadernos, lápis, borracha, apontador, etc., todo o material era comprado pelos pais, nada era dado pela escola, como disse acima, nem merenda e nem material ou uniforme. Quando tínhamos de tomar um ônibus para ir para a escola, pagávamos meia passagem por sermos alunos, uniformizados. Se não estávamos de uniforme era cobrada então a passagem integral.
Estudávamos das sete horas ao meio dia e a tarde era horário de treze às dezoito horas. Nunca morremos, brincávamos, fazíamos trabalho de casa… e como tinha trabalho de casa. As provas eram todas escritas, assim como a grande parte do que era apresentado em sala de aula. Tudo era retirado das Cartilhas, Tabuada que tinha de ser decorada, caderno de Caligrafia era obrigatório e se não apresentássemos feito tínhamos de fazer três vezes mais. Não tínhamos direito de falar em sala, se não levantássemos a mão para evitar confusão e discussão em sala de aula.
Eu tenho uma marca negra em minha vida acadêmica… Por duas vezes tentei passar no Exame de Admissão ao Ginásio e fui reprovado mesmo sendo como disse um dos três melhores alunos da sala de aula, era um Vestibular para ser admitido no Curso Ginasial do Ensino Público, sendo então obrigado a ter de estudar em escola particular, o que era um demérito para um bom aluno.
Nos anos 60, mesmo não tendo conseguido passar para o Ginásio Público, o Primário me deu base para ser um aluno com boas notas.
O interessante é que meu pai era um operário da Fábrica de Tecido Bangu e minha mãe era dona de casa, não éramos pessoas de posse, muito pelo contrário, tínhamos um padrão de vida de classe pobre, porém, mesmo a classe pobre nessa época tinha dignidade de vida. Mesmo sem entrar no mérito do assunto, tínhamos SAMDU – Serviço de Assistência Médica Domiciliar e de Urgência da Previdência Social, que contava com Ambulâncias e Postos de Saúde, bancados pelo Ministério do Trabalho, Industria e Comércio, lançado em 1949.
Observamos que haviam estruturas que garantiam a saúde e a educação de nossas crianças. Sem paternalismos ou populismos e as crianças estudavam e muito. Lembro que todas as pesquisas que eram feitas, sempre contávamos com as Enciclopédias.
Os anos 60 a Educação ainda mantinham uma educação forte, mesmo em História termos muito mais de decorar datas, dados, nomes e lugares, em Geografia termos de decorar os afluentes dos Rios principais que eram muitas das vezes conferidos nas chamadas Provas Orais, que eram normais, mensais e cobradas com muito afinco para ver se os alunos haviam aprendido e apreendido o conteúdo ensinado pelas professoras, lembrando que naquela época nossas mestras vinham dos Institutos de Educação, e eram profissionais que possuíam Status e excelente salário. Uma moça professora oriunda do Instituto de Educação ou um rapaz oriundo do Colégio Militar ou Pedro II era um Status para lá de grandioso para as famílias.
Um momento muito rico e importante de nossa educação, onde nenhuma criança, mesmo as que eram levadas para o quarto do Castigo quando não cumpriam com suas obrigações ou que eram pegas fazendo bagunça em sala de aula, são traumatizadas. E, Quarto de Castigo era Castigo mesmo, copiar, centenas de vezes NÃO DEVO DEIXAR DE FAZER MEU DEVER ou NÃO DEVO FAZER BAGUNÇA NA SALA DE AULA.
Não conheço ninguém que seja traumatizado por isso, pelo contrário, passavam a ter uma letra bem escrita e reconhecível. E, para quem não conseguia no final do ano contar com os 28 pontos mínimos do somatório de notas, por matéria, amargava ter de refazer no ano seguinte novamente aquele ano de ensino.
Os anos 60 eram ainda resquícios dos antigos Liceus e ensino de base e de qualidade, com cobranças fortes e importantes, como saber Tabuadas de cor e salteado, conjugar verbos e saber das datas (efemérides) importantes do Brasil.
Essa foi uma visão bastante superficial da educação na década de sessenta, através de meu olhar. Sabemos que muito mais era exigido. Os ginásios públicos eram uma excelência de ensino, o Normal ou Clássico, depois, Científico, eram escolas de ensino de alta qualidade e as faculdades eram polos de conhecimento de alta qualidade, ainda não tínhamos uma doutrinação feita nas universidades e a UNE já era um braço contrário ao Regime Milita. Era o início da penetração de esquerda na Educação através desse braço político educacional, altamente combatido pelo Governo Militar, por conta das manifestações contraria ao Regime. Os bancos escolares de nível superior já possuíam pensadores de esquerda, mas, ainda estavam em formação da doutrinação e qualquer tipo de manifestação contraria ao regime era combatido duramente. Lembramos que estávamos num período de Guerra Fria e o Brasil se colocando a favor dos Estados Unidos, freava qualquer manifestação que tivesse cunho esquerdista dentro do contexto da Educação.
Neste primeiro Artigo demos um breve visual de nossa educação na década de 60, na próxima semana, estaremos então discorrendo sobre a década de 70.
Até lá
Rio 24 de Novembro de 2018
Luiz Gustavo Chrispino